Como fazer queixa de burla online

Rui Cruz
Criado a

Se chegaste até aqui é porque provavelmente foste ou conheces quem tinha sido vítima de burla online. A burla online é cada vez mais comum, sendo reportado um aumento de 20% de queixas no ano passado em comparação com o ano anterior, e por isso é um tema fraturante da sociedade que deixa muitas pessoas literalmente “sem nada” quando se trata de dinheiro. Existem  algumas coisas que se pode fazer para evitarem burlas , e usar aplicações seguras para comunicação como as que mencionei na minha palestra sobre privacidade em 2018 (e que ainda está muito atual) é um bom começo para evitar burla online.

Mas quem chega a este artigo e já foi vítima de burla,  o que pode fazer? E como o pode fazer? 

 

Passo 1 – Obter todos os detalhes da burla online

As primeiras coisas que um polícia quer saber é “ onde, quando e como ” e isto é válido também no contexto digital. Neste caso, tens de recolher todas as provas associadas à tua queixa, ou seja printscreens, cópia de conversas , no caso de ser feito um pagamento à “EDP” (burla da EDP) o comprovativo de pagamento bancário, ou seja, tudo o que “prova” que foste enganado.

Podes imprimir tudo caso queiras entregar numa esquadra da PSP, posto da GNR ou na PJ, ou se preferires, guardares tudo numa pasta e enviares online (já lá vamos a esse passo). Mas precisas de toda a informação, mesmo aquela que não aches relevante, desde que o contacto com a pessoa aconteceu até ao momento em que te apercebeste da burla.

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Passo 2 – Fazer queixa de burla online

Este passo pode ser dividido em duas opções,  a queixa física ou digital . Como se trata de um crime digital a minha sugestão será sempre o digital. No entanto se quiseres podes ir a um local de um OPC (órgão de polícia criminal) como a PSP, GNR, PJ, que são os mais comuns. Existem algumas pessoas das forças de segurança que podem estar mal informadas e não quererem aceitar a queixa ou dizem que não vale a pena fazer… e isso é ilegal.  Eles têm que aceitar uma queixa, e escrever o que tu disseres, e têm que guardar os documentos que tu quiseres apresentar na queixa.  Para teres uma ideia, se fores a uma esquadra da PSP e disseres que queres apresentar queixa de um extraterrestre verde que te roubou a casa, eles são obrigados a escrever tudo o que dizes. A PSP ou qualquer outra entidade apenas reporta, quem diz que é crime é o Ministério Público, que por sua vez também acusa.

Por outro lado, se quiseres fazer uma queixa online, podes ir ao site da PJ e fazer uma queixa eletrónica e vais precisar para isso de um leitor de cartão de cidadão ou da Chave Móvel Digital. Preenches todos os campos e anexas todas as informações que irias entregar fisicamente, descrevendo pelas tuas palavras o que aconteceu . Preenches também os teus dados pessoais e anexas os ficheiros que irias imprimir se fosse num local físico.

Em qualquer caso, não apagam nada (mesmo o que achem que não é importante) porque podem ser pedidas coisas mais tarde e guarda prints do que pode ser eventualmente perdido. Por exemplo, se tiveres uma chamada no iPhone, vai aos detalhes da comunicação e tira print, porque se te pedirem algo daqui a uns meses essa chamada não vai estar no iPhone para dizeres a hora a que recebeste.

Tens aqui alguns  recursos que te podem ajudar a organizar ou criar  ficheiros para a tua queiax de burla online.

 

Passo 3 – A análise da queixa de burla online

Se for uma queixa eletrónica recebes um número que não é o NUIPC (número único identificador de processo crime) mas sim um mero registo na plataforma. Para obteres este número podes ligar duas ou três semanas depois para o tribunal da tua área de residência, pedires para falares com o DIAP (Departamento de Investigação e Ação Penal) e identificares-te, questionando se já existe número de processo.  Se for apresentada fisicamente ficas logo com este número . O NUIPC é o número que vai identificar o teu processo durante toda a “vida” dele, até à fase de julgamento.

Agora o tribunal tem  8 meses para analisar a tua queixa  em regra geral, mas o prazo pode ser alargado. O facto é que nem sempreos prazos são respeitados, mas honestamente é o que temos. Podes pedir advogado oficioso, que no caso de ganhares o ordenado mínimo ou pouco mais acaba por ser aprovado, pedindo também a isenção de custas judiciais no mesmo documento.

Quer tenhas ou não advogado oficioso (grátis),  este processo deve ser sempre acompanhado por advogado , embora tu como queixoso possas fazer requerimentos ao processo.

 

Passo 4 – Vai a julgamento ou fica arquivado?

Se não encontrarem indício de crime, o processo é arquivado após análise do Ministério Público.  Se por outro lado existir crime vão fazer a acusação se existirem provas suficientes e vão a julgamento  (ainda há uma outra fase possível antes do julgamento, a instrução, mas assim fica mais simples de se entender).

Em julgamento são  debatidos os factos e podem-se ouvir peritos na matéria se convocados atempadamente . Esses peritos são pessoas como eu, com conhecimentos técnicos em cibercrime, e  podem ser ouvidos pelo tribunal ou na fase em que a queixa está ainda a ser analisada  pelos próprios escritórios de advogados, para sugerirem que se peçam diligências específicas ao processo.

Já estive em várias salas de julgamento e  sei que na maioria dos casos os juízes pouco percebem destas coisas da Internet e somos nós que os temos de ajudar , com o nosso conhecimento, para tomarem uma decisão mais fundamentada sobre a tua queixa de burla online.

 

Em resumo, é isto

Agora que sabes como se apresenta uma queixa por burla,  é também importante prevenir que caias numa burla , e um curso do CNCS  (eles têm vários, que são grátis e online) pode ser uma excelente base para evitar fraudes. No entanto, se caíres numa burla destas, já tens aqui um bom resumo do que podes esperar da justiça e de como todo o processo corre.